Umberto Eco
O meu primeiro contacto com a obra de Eco foi há uns anos atrás, quando elaborava um artigo para uma disciplina de mestrado. Apesar de Umberto Eco estar na minha lista de leitura desde há vários anos, outras obras foram-se insurgindo e livros como O nome da Rosa, O cemitério de Praga ou O pêndulo de Foucault foram ficando em espera. Assim, a descoberta de Eco foi com dois ensaios e não com os romances. As obras em questão foram Apocalípticos e Integrados (recentemente editado em Portugal) e Sobre os espelhos e outros ensaios e logo aí encontrei retratadas algumas das minhas preocupações, intuições e inquietações sobre a cultura de massas e outros assuntos relacionados.
No ano passado li a sua última obra, Número Zero, e novamente, mais do que um romance, é um explorar de problemáticas atuais como a manipulação da informação pelos meios de comunicação, manipulação que pode ser feita de formas tão engenhosas quanto básicas, condicionando opiniões, conduzindo as sociedades para onde alguns as querem.
Neste último fim-de-semana, com a notícia da morte de Eco, a internet ficou submergida em frases proferidas pelo autor, palavras que supostamente deveriam definir um homem, a sua vida, a sua obra. E no meio dessa torrente de citações, uma delas brilha mais do que as restantes, não pelo epítome da vida de Umberto Eco, pois isso seria uma impossibilidade, mas pela definição da minha relação com a sua obra:
Alguém que é feliz a vida toda é um cretino; por isso, antes de ser feliz, prefiro ser inquieto.
A inquietude como mote de vida, a busca por aquilo que, à partida, sabe-se que não trará felicidade, qualquer aplacar do desassossego interno, mas antes será mais uma acha para a fogueira da inquietação — isso será a mais próxima definição da minha relação com a sua obra. Não é a beleza, a contemplação bucólica da perfeição, mas o desassossego que me conduz por entre as páginas do seu legado.
Por isso, ao invés de nos chorarmos por aqueles que têm o condão de não desaparecer por completo, aqueles que nos deixam resquícios de si, do seu pensamento, da batalha intelectual de uma vida, peguemos num livro, numa das suas obras e celebremos a sorte de pessoas destas terem nascido e deixado para os restantes mortais testemunhos clarividentes, heranças de uma inteligência inquestionável.