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Quimeras e Utopias

Quimeras e Utopias

O Medo

O mundo era assim há uns anos atrás? Este medo que sinto justifica-se ou isto, a forma como os governos degeneram as sociedades, a violência, a manipulação, o egoísmo, o retrocesso civilizacional, a cada vez maior incapacidade de discernimento, de espírito crítico das pessoas, dos povos, isto tudo já cá estava antes e eu era simplesmente jovem demais, dormente demais para me dar conta?

 

Vemos chegar ao poder seres humanos abjectos, seres humanos sem valores, com ideais retorcidos, fomentadores de ódio, fomentadores da agressão e todo um discurso que julgava impossível, inaceitável, é hoje proferido com normalidade e aplaudido de pé por milhões.

 

Na Turquia, um golpe ou pseudo-golpe serve para empoderar um governo já de si sedento de poder, um governo que pretende atirar para as urtigas as bases fundamentais da democracia, reintroduzir a pena de morte, expurgar os opositores; ataques violentos sucedem-se sob a égide do DAESH em países europeus, deixando centenas de mortos e feridos como memória dolorosa destes eventos, alterando a nossa perceção de segurança e liberdade; milhares de refugiados desaguam Europa adentro, reencaminhados para campos turcos, tratados como uma mercadoria indesejável, moeda de troca de negociações duvidosas entre Estados e Organizações que se queriam sérios, altruístas e não burocratas e movidos pela mesquinhez.

 

Numa farsa histriónica que só dá vontade de gritar: «Mas mais ninguém vê isto, o óbvio?», os governos ocidentais continuam a ter relações cordiais com Estados promotores do terror e do extremismo, com a Arábia Saudita a aparecer na fotografia como amigo inquestionável, mas indubitavelmente sinistro, ameaçador, mas os negócios, os interesses financeiros, geoestratégicos estão primeiro do que as nossas vidas, a nossa segurança, a ética, a nossa liberdade e honra.

 

Numa UE disfarçada de organização fidedigna, os colossos financeiros, os bancos, os mercados organizam a forma como viveremos o dia de amanhã e qual o castigo que teremos de aguentar por ELES se terem portado mal, porque nenhum de nós interessa, somos apenas números, peões num jogo de tabuleiro.

 

Síria, Iraque, países em pedaços que, numa visão lírica mas talvez real, são vítimas de um efeito borboleta: uma guerra encomendada, sem nexo, com motivações inventadas, um encontro de «amigos» poderosos que, a longo prazo degenerou nisto, numa devastação inconcebível, em milhares de mortos, feridos, deslocados e pior do que tudo, pessoas irreversivelmente danificadas na sua alma, no seu interior.

 

Ao crescer sempre julguei que as conquistas eram irreversíveis. Quando se anda para a frente já não é possível voltar-se atrás, quando se avança não se recua. O que se conquistou já não nos foge entre mãos. Estava redondamente enganada.

 

E agora é isto, este medo. Apenas sobra o medo. O medo e o prenúncio de algo mau que marcha na nossa direção.

 

 

Pokemons na horta

Só para avisar que vi um pokemon a rabiar no meio das ervas da minha horta. Como não conheço muito bem a fisionomia da bicheza em questão, se calhar também podia ser um gaio, um melro ou um ratito do campo. De qualquer das formas, não quis deixar de avisar os potenciais interessados.

 

Mas se lá forem à caça do bicho, façam o favor de não me desgraçarem os pepinos e as alfaces.

Problemáticas de uma mãe

Enquanto mãe, uma das problemáticas que mais conflitos interiores me causa é a questão da educação. Que valores deverei transmitir ao meu filho? Os valores que para mim são fundamentais parecem estar em desuso: não faças aos outros o que não queres que te façam a ti; o mais importante na vida é dormir de consciência tranquila; a tua integridade, a tua liberdade, o amor ao próximo e à natureza, a empatia pelos outros serão os teus cavalos de batalha.

 

No entanto, passar estes valores a um filho talvez seja um enorme erro. Queremos que eles sejam íntegros, mas também queremos que eles sejam felizes e para serem felizes quase necessariamente necessitarão de atingir sucesso. E até que ponto é que o sucesso, seja ele em que área for, se coaduna com a integridade?

 

Os exemplos que nos chegam diariamente gritam-nos que que a integridade é coisa de totós. Há muito que a moral e a ética forma substituídas pela legalidade e a legalidade rendeu-se a interesses vários, a legalidade tornou-se um labirinto ao serviço de alguns.

 

Maria Luís Albuquerque vai trabalhar para a gestora britânica Arrow mantendo funções de deputada e destas andanças apenas surgiu a pergunta da legalidade da coisa. É legal? Parece que sim, mas talvez pouco ético. Como ela, outros deputados, ex-ministros (da direita à esquerda) são convidados para ingressarem em empresas cujos interesses chocam com a antiga actividade política dos seus novos funcionários. E tudo isto é normal, aceitável, mas muito pouco íntegro.

 

Passando para a estratosfera internacional, o «nosso» Durão sai da Comissão Europeia, onde supostamente deveria zelar pelos interesses dos cidadãos que integram a UE, para ingressar os quadros da maior mercenária financeira da praça, um autêntico predador económico, a Goldman Sachs. E tudo isto se passa, como dizia o outro, com muita tranquilidade.

 

Numa diferente área, num fenómeno mais abafado, menos comentado, mas, a meu ver, mais degradante, Anders Kompass, antigo alto-funcionário da ONU demitiu-se depois de meses denunciando abusos dos capacetes azuis em territórios onde estes deveriam defender as pessoas e não violá-las, raptá-las, comprá-las para favores sexuais em troca de comida. Anders não aguentou a falta de integridade de uma organização que, informada dos abusos há meses, anos, nada fez, olhou para o lado e ainda o pressionou quando ele revelou para a imprensa relatórios internos que denunciavam esses atos atrozes.

 

O íntegro cai, é esquecido, posto para o lado, substituído por alguém que saiba jogar o jogo da corrupção, da falta de escrúpulos, do arrivismo pessoal.

 

Do íntegro não reza a história.

 

E assim, que digo ao meu filho? Que valores lhe transmitirei?

 

 

Durão barroso.jpg

 

Isto não foi só futebol

Isto não foi futebol, foi psicoterapia coletiva. Foi o melhor livro de auto-ajuda que tivemos a oportunidade de ler, a melhor life coach que algum dia poderemos consultar nesta vida.

Isto não foi futebol, foi um poema épico. Foi a jornada contada de um herói, timoneiro espiritual de um grupo, que caiu por terra quase no início do jogo, por entre lágrimas e traças poéticas, sendo vingado, numa reviravolta dramática, pelo mais feio dos patinhos (assim o julgavam), tornando-se ele próprio num novo herói improvável.

Isto não foi futebol, foi um hino contra a xenofobia, contra o racismo.

Isto não foi futebol, foi uma lição de humildade. Uma lição para aqueles que já se julgavam vencedores ainda antes de enfrentarem o seu adversário, uma lição para aqueles que se julgam os escolhidos, os donos de uma qualquer superioridade abstrata. Que nunca se esqueçam.

Isto não foi futebol, foi uma maneira de mostrar que a nossa maneira de ser e fazer também é válida, mesmo que seja mais parola, mais estridente, menos emocionante. Foi uma forma de mostrar que o caminho pode ser feito por muitas e diversas estradas, sendo que algumas delas poderão estar todas esburacadas. Foi ainda uma maneira de mostrar que a nossa parolice e estridência podem ter algum glamour à mistura.

Isto não foi futebol, foi um levantar de queixo para milhares de emigrantes subalternizados por senhores e senhoras de bem, que embora os «respeitassem», sempre os viram como cidadãos de segunda, mão-de-obra dirigida a um tipo exclusivo de trabalho.

Isto não foi futebol, foi um terramoto que terá réplicas vindouras que nos farão estremecer, mexer, correr, batalhar até à exaustão, até ao suspiro final.

 

campeoes_2016.jpg

 

Homo sapiens tatuadus

No dia-a-dia dá para perceber que um número crescente de pessoas tem em si tatuagens. Considero estarmos perante uma nova idade terrestre: a idade da tatuagem. Não o digo como uma consideração negativa, apenas como uma constatação.

 

E na praia isto torna-se mais evidente. O pessoal descasca-se quase totalmente e aí mulheres de meia-idade, jovens insuspeitas, homens de família revelam tatuagens de costas inteiras de anjos, caveiras, flores e desenhos intrincados, pernas femininas tatuadas com desenhos que fazem lembrar cintos de ligas com lacinhos e rendinhas, tatuagens benfiquistas em braços rechonchudos, as batidas tatuagens tribais em braços e pernas e, claro, as frases e nomes em árabe, hebraico, chinês, japonês ou num outro tipo de língua que use na sua escrita caracteres «esquisitos».

 

Num destes dias, perplexa pelos corpos tatuados que se revelavam a cada roupa despida, cheguei a ter medo da possibilidade de ser multada por ser a única pessoa adulta na praia que não era tatuada.

 

— «Faça favor, são cinquenta euros de coima pela ausência evidente de desenhos marados no seu corpinho.»

 

Esta possibilidade luta lado a lado com uma outra: o surgimento de um esquadrão de peritos que me leve para um museu ou zoológico, para me exporem como espécime humano raro em vias de extinção.

 

O melhor é manter-me com a roupa no corpo a fim de não revelar a criminosa ausência de escritos e desenhos corporais.

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